terça-feira, abril 27

..como os nossos pais..

- Mas isso não pode continuar assim… todo esse ódio. Há de vir uma reação – replicou Hammond.
- Por ela estamos esperando, e muito esperaremos ainda. O ódio é algo que pode crescer como nenhum outro sentimento. É o resultado inevitável da violência imposta aos nossos instintos mais profundos: violentamos os nossos sentimentos mais puros para enquadrá-los em certas máquinas. O espírito lógico pretende governar os homens... e surge o ódio. Todos somos bolchevistas, com a diferença de que somos hipócritas também. Os russos são bolchevistas sem hipocrisia...
- Mas há outras maneiras de ser bolcheista, além da soviética – disse Hammond. – Os bolchevistas não são inteligentes.
- Naturalmente que não. Mas às vezes inteligente é ser imbecil: conduz ao fim visado. Eu, de minha parte, julgo o bolchevismo imbecil; nossa vida social, no Ocidente, é também imbecil; e nossa famosa vida intelectual também é imbecil. Somos todos uns cretinos, idiotas sem paixão. Somos todos bolchevistas... a diferença é que damos a isso outros nomes. Acreditamo-nos deuses, homens semelhantes a deuses. Isso é bolchevismo! Temos de ser humanos; temos de ter um coração e um pênis para escaparmos de ser um bolchevista. Porque Deus e o bolchevista são a mesma coisa, algo belo demais para ser verdade.
No meio de um silêncio desaprovador ergue-se, ansiosa, a voz de Berry:
- Acredita no amor, Tommy?
- Pobre criança! – respondeu ele. – Não meu querubim, mil vezes não! O amor dos nossos dias é ainda uma dessas comédias imbecis. Janotas que enfiam em moças com nádegas de criança que lembram botões de colarinho. É dessa espécie de amor que quer falar ou do amor de coleira, do tipo “meu-marido-minha-mulher”? Não, meu amigo, não creio no amor.
Mas crê ao menos em algo?
-Eu! Intelectualmente creio em se ter um bom coração, e um pênis em bom estado, uma inteligência viva e a coragem de dizer “merda” diante de uma senhora.
- Tudo isso você tem – murmurou Berry.
Tommy Dukes dobrou-se de rir.
- Meu anjinho, ah se assim fosse! Se assim fosse! Não, meu coração vive inerte como uma batata, meu pênis nunca levanta a cabeça... e preferiria cortá-lo a dizer “merda” diante de minha mãe ou minha tia, damas respeitáveis; e tampouco sou inteligente. Sou apenas um interessado no intelecto. Que bom ser inteligente! Sentir que se vive em todas as partes, as nomeáveis e as não nomeáveis. Com o pênis ereto, dizendo bom dia a todos os inteligentes de verdade. Renoir pintava os seus quadros com o pênis... e que lindos quadros! Quisera fazer qualquer coisa com o meu. E só sei falar! Tortura inédita acrescentada ao inferno. E foi Sócrtaes que começou...

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